Censo 2022: alterações no perfil demográfico impactam políticas públicas

Após uma trajetória atribulada, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) conseguiu finalizar e divulgar os primeiros dados do Censo Demográfico 2022, com a contagem populacional, que deriva em uma série de informações. Além de indicar os contingentes populacionais por município, estado e região, a contagem é a base para informações essenciais como a composição étnica, a renda, a educação, a saúde, entre outros aspectos. Dados fundamentais para o planejamento e a implementação de políticas públicas, identificando a população alvo para a qual elas se destinam e atendendo às necessidades de forma cada vez mais qualificada. Mas quais são os impactos imediatos dos dados apresentados pelo Censo Demográfico 2022? 

Previsto para acontecer a cada dez anos, este Censo sofreu com atrasos e problemas diversos. Ele deveria ter ocorrido em 2020, mas foi adiado pela pandemia e por falta de recursos orçamentários. Mas o fato é que o Censo Demográfico 2022 foi concluído e traz um retrato atualizado da população brasileira que está sendo divulgado de forma bastante transparente pelo IBGE. 

A primeira atualização diz respeito à contagem populacional. O Brasil alcança 203,1 milhões de habitantes, informação que surpreendeu, porque representa 4,7 milhões de pessoas a menos do que a projeção composta por dados iniciais do Censo, divulgada pelo próprio IBGE em dezembro de 2022. Esse dado indica também que os processos demográficos estão acontecendo de uma forma mais acelerada do que se imaginava nos últimos doze anos. Nesse período, a taxa de crescimento populacional foi de 0,52% ao ano, a menor desde o primeiro Censo em 1872. No Censo 2010, essa taxa era de 1,17%.

Além do baixo crescimento populacional, os dados revelaram que o Centro-Oeste do Brasil foi a região com maior crescimento proporcional de habitantes e que houve redução da população em 2.397 municípios, incluindo em nove capitais. Constata-se, ainda, redução do número de moradores por domicílio (de 3,31 em 2010 para 2,79 em 2022) e aumento de 34% do número de domicílios desde 2010.

Censo 2022 indica três tendências nos processos demográficos

O Censo 2022 registra algumas tendências nos processos demográficos. Segundo a análise do demógrafo e professor da Unicamp Roberto Luiz do Carmo, que presidiu até dezembro de 2022 a Associação Brasileira de Estudos Populacionais (ABEP), elas podem ser organizadas em três processos. Uma grande tendência é a diminuição da natalidade associada a um processo de queda da fecundidade. O Brasil está abaixo do nível de reposição populacional há pelo menos uma década. Outra grande tendência é o aumento da mortalidade causada pelo envelhecimento da população que já está em processo nas últimas décadas - ligado à redução da fecundidade e ao aumento da longevidade. O terceiro componente da dinâmica demográfica brasileira é a migração. Mesmo ocorrendo importantes fluxos migratórios no último período, observa-se uma compensação entre entradas e saídas do volume da população no Brasil. 

Com crescimento populacional cada vez mais lento, provavelmente na próxima década o Brasil vivencie algo inédito: a diminuição do volume da sua população, repercutindo na perda de população de mais da metade dos 5.570 municípios. É um fato em si que carrega desafios para pensar a organização social e política, que tem na base da estrutura municipal, a organização dos serviços que chegam até a população. 

Impactos imediatos do Censo 2022

Os dados do Censo têm um papel fundamental na definição da representação política do país, ou seja, no número de parlamentares nos níveis federal, estadual e municipal. A Constituição determina que o número de deputados federais por estado deve ser proporcional à população, respeitando o limite mínimo de 8 e máximo de 70. Assim, após a realização do Censo, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) deve atualizar o cálculo da representação dos estados na Câmara dos Deputados. Esse cálculo também afeta o número de deputados estaduais e distritais, que é igual ao triplo da representação na Câmara dos Deputados, respeitando o limite mínimo de 24 e máximo de 94. Já o número de vereadores por município é definido pela Emenda Constitucional nº 58/2009, que estabelece faixas populacionais e limites máximos para a composição das câmaras municipais. 

Os dados impactam na distribuição dos recursos da União, pois são usados para definir os coeficientes do Fundo de Participação dos Estados (FPE) e do Fundo de Participação dos Municípios (FPM), que são transferências constitucionais da União para os entes federados, baseadas na população e na renda per capita de cada um.

Os dados subsidiam o planejamento e a avaliação de políticas públicas nas áreas de saúde, educação, assistência social, infraestrutura, meio ambiente, segurança, entre outras. Além disso, as informações podem orientar a alocação de recursos públicos, a definição de prioridades e metas, a identificação de demandas e necessidades da população, a formulação de indicadores e a elaboração de diagnósticos e prognósticos.
As características socioeconômicas do país geradas pelo Censo são fundamentais para a gestão de pessoas e o dimensionamento da força de trabalho do serviço público. Uma vez que permitem identificar as demandas e as necessidades dos moradores em cada região, esses dados apoiam na orientação da gestão pública a suprir lacunas e superar os desafios para a prestação de serviços de qualidade planejando concursos públicos ou novas atividades no setor público. 

Enquanto pesquisadores, analistas e gestores públicos se apropriam dos dados interpretando o retrato do Brasil que saiu do Censo 2022, um conjunto de perguntas vão sendo gestadas para compreender o significado da transição demográfica pela qual o país atravessa. Questões essas como o tamanho e a composição das famílias, os novos empregos e ocupações, o perfil do desemprego e a previdência social, o financiamento da educação e da saúde universais e de qualidade, a organização federativa, fluxos migratórios, a ocupação de imóveis, a população sem moradia, recortes de gênero, raça e etnia, entre tantas outras dimensões. O Censo é um processo fundamental para subsidiar políticas públicas mais efetivas respondendo de forma mais eficaz aos problemas da população e tradicionalmente é utilizado pelo Estado para tanto. Mas ele também pode ser uma fonte de dados potente para subsidiar a luta por direitos sociais, de maneira que ativistas de movimentos sociais possam se apropriar de seus dados, transformando-os em conhecimento, possibilitando mais força para suas pautas.